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Novas exposições no CCJF se utilizam da arte para evidenciar apelos sociais 

Publicado em:
08/08/2025
Série de fotografias emolduradas com bordas brancas, dispostas em linha sobre uma parede clara, apresentando composições abstratas e coloridas, com predominância de tons quentes, como vermelho, laranja e verde, que sugerem movimento e textura. As obras integram a Exposição Baixa Tecnologia.
Imagens da Exposição Baixa Tecnologia

Em julho, duas novas exposições abriram no Centro Cultural Justiça Federal (CCJF). Gratuitas, Baixa Tecnologia, do fotógrafo e artista visual Pedro Stephan, e Cinco convites a um levante, do artista visual Alex Frechette, ocupam as galerias do 1º andar do CCJF e oferecem ao público duas reflexões interessantes: a primeira exposição retrata a arte por trás de experiências fotográficas que fogem da técnica e do controle da imagem, colocando em xeque a urgência da tecnologia; já a segunda representa um apelo à mobilização através de cinco pinturas que registram protestos recentes ocorridos no Brasil, Chile e Argentina.

Baixa Tecnologia, um registro quase análogico da diversidade — Mais estética e beleza, menos factual. Ao usar um celular antigo — de apenas um megapixel — que produz imagens distorcidas e se vale de um ambiente de pouca luz, Pedro Stephan, que há décadas dedica seu portfólio a abordar o tema da diversidade sexual e de gênero, fotografou performers da noite carioca e paulista. O resultado é expressivo e surpreendente. São 26 imagens, desfocadas e com cores vibrantes, que compõem a exposição Baixa Tecnologia, que abriu dia 3 de julho no CCJF, com curadoria de Ângela Magalhães e Nadja Peregrino. Por trás das fotografias, um questionamento levantado por Stephan: até que ponto aceitar a rapidez tecnológica em que somos impingidos a absorver, devido, inclusive, ao consumismo imposto pela indústria? “Nós que vivemos o antes e depois da revolução tecnológica, fomos empurrados… tínhamos o vinil, o CD, o CD-Rom, o DVD, etc. Hoje em dia, não dá para usar no computador um programa mais antigo porque a própria fábrica dá um jeito de não permitir isso, e aí o programa fica obsoleto e você não consegue usar. Na verdade, o que proponho é uma rebelião e uma prova de que as coisas que foram deixadas para trás não são ruins. Elas foram deixadas para trás, em parte, por causa da indústria que quer vender, vender e vender”, ressalta o artista.

Essa é a segunda vez que Stephan, um dos fotógrafos pioneiros em evidenciar a Comunidade LGBTQIAPN+, expõe no CCJF. A primeira mostra, que ocupou o Centro Cultural em 2007, foi Entre Amigos e Amores: os espaços LGBTI+, marcante por ter sido a primeira exposição dedicada à diversidade sexual e de gênero na era pós-Aids. “De lá para cá, se abriu mais espaço para falar sobre isso, apareceram pessoas de outras gerações e eu tenho acompanhado tudo; continuei fotografando e participando ativamente das militâncias, dos movimentos. Para mim é uma felicidade continuar desenvolvendo uma linguagem, uma poética, um olhar, um estilo sobre essa temática”, diz. Ao comentar sobre o processo de produção das obras reunidas em Baixa Tecnologia, ele destaca a experiência marcante que teve de “perder o controle" ao fazer os cliques das imagens. “Eu não tinha o controle exato do que eu estava fotografando como eu tenho com a câmera ‘normal’. De noite, eu conseguia ver pelo pequeno visor daquele celular mínimo, em um lugar aberto ou fechado com uma luz diferente… dirigia mais ou menos o ângulo da minha câmera do celular, não havia controle da velocidade, não tinha flash”, conta Stephan, que admite ter passado por uma experiência diferente. “Gosto de ter esse controle quando fotografo. Mas, nesse caso, perdê-lo foi um grande aprendizado para mim, inclusive na coisa da intuição, deixá-la falar mais alto do que aquilo que você vê no visor da câmera — algo que, muitas vezes, não é aquilo que a câmera vai registrar”.

Grande painel colorido exibido em parede clara, retratando personagens pedalando bicicletas em meio a frases e cartazes que defendem o uso da bicicleta como meio de transporte e direito social. A cena, marcada por traços expressivos e cores vibrantes, é uma das telas que compõem a Exposição Cinco Convites a um Levante.
Obra que integra a exposição Cinco Convites a um Levante, de Alex Frechette, em cartaz no CCJF.

Cinco convites a um levante, o olhar do artista nas dimensões 5m x 1,60m — O conjunto das cinco grandes telas, de cores vivas e impactantes, evidenciam os protestos recentes ocorridos no Brasil, Chile e Argentina, experienciados pelo artista. Porém, mais do que isso, instiga o público a uma reflexão crítica sobre os discursos políticos e sociais que emergem dessas manifestações, além de explorar a relação arte versus ativismo. Cada tela de 5m por 1,60m, caracterizadas por traços expressionistas, retrata uma manifestação popular: o protesto por conta da falta de energia elétrica, em Niterói, no Rio de Janeiro, após períodos de chuva; o protesto na Cinelândia, Centro do Rio, contra a tentativa de golpe de Estado ocorrida em 8 de janeiro de 2023, em Brasília; uma demonstração de solidariedade à Palestina em Santiago do Chile, país reconhecido por abrigar a maior comunidade palestina fora do Oriente Médio; os apelos por justiça no Centro do Rio de Janeiro após o assassinato de uma artista circense e cicloativista venezuelana; e as agitações sociais na Argentina, após as recentes mudanças econômicas e políticas.

Frechette explica que a inspiração para Cinco convites a um levante surgiu em um dia, quando saiu do CCJF, na época em que ocupou as galerias do Centro Cultural com a exposição 8 de Janeiro – Jamais Fomos Modernos, entre outubro de 2023 e janeiro de 2024. “Quando saí da mostra estava tendo um protesto aqui em frente sobre o ‘8 de Janeiro’. Lembro que estava saindo com umas pinturas e vi essa galera. A cena serviu de base para a pintura ‘Vermelho’, que trata da busca pela democracia, contra a invasão dos prédios de Brasília, em 8 de janeiro de 2023. Aquelas cenas que vimos do pessoal quebrando e depredando os prédios e objetos, pintei me inspirando no Di Cavalcanti. Então é uma continuação do trabalho anterior, e os demais temas foram aparecendo…”, conta Frechette.

Segundo os organizadores, entre mísseis, feminicídios, arbitrariedades, tentativas de golpe e cortes de energia elétrica, a exposição incita os espectadores a encararem o presente como um movimento em direção à coletividade, em busca de justiça, além de uma poética que inspire a ação de um levante — um levante que vise a radical transformação do mundo.

Ambas imperdíveis, venha conferir! As mostras ficam no CCJF até o dia 31 de agosto de 2025. O funcionamento é de terça-feira a domingo, das 11h às 19h.